A alma e o corpo

(Conhecer-se na rede)


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de Giancarlo Livraghi gian@gandalf.it – fevereiro 1997

Teadução em português de Priscila Gomes pris@highway.com.br – marzo 2000

 
 
 
 

Conheci mais pessoas através da rede do que em qualquer tempo ou qualquer outro modo. Alguns destes encontros se transformaram em amizades verdadeiras. Nem todos aconteceram diretamente. Através da rede conheci alguém, mediante desta pessoa depois encontrei outros.... mas é na rede original que há a descoberta. Pode ser de alguém que mora longe (para encontrá-la precisa viajar) ou então próxima, a poucos passos da minha casa e não sabia.

Às vezes pensamos juntos sobre este modo de se conhecer. O tema, em muitos aspectos, é fascinante.

Encontramos uma pessoa que não podemos ver nem tocar. Antes de vê-la fisicamente conhecemos os seus pensamentos, o caráter, o temperamento. Nasce um relacionamento, um interesse recíproco, uma troca de pensamentos e de emoções; cresce o desejo de se encontrar; e um dia, finalmente, nos encontramos pessoalmente. A pergunta habitual é «Sou muito diferente daquilo que você imaginava

Concluímos que o caminho é oposto daquele habitual: conhecemos primeiro a alma e depois o corpo.

Não é correto dizer que se primeiro vemos e depois falamos, nos conheceremos melhor. Muitas vezes o encontro físico nos afasta; esconde ou atrapalha o encontro com a alma e com a mente. Existem pessoas que se vêem há vinte anos, talvez dividem a mesma cama e não se conhecem bem. Não é mentira a frase clássica dos infiéis: «A minha mulher (ou o meu marido) não me entende». A proximidade física não é necessariamente diálogo e compreensão; pode até mesmo se transformar em um obstáculo.

Na rede acontecem coisas curiosas e interessantes. Existem pessoas que nas suas mensagens me falaram delas com grande sinceridade, dividindo emoções, confessando dúvidas e sentimentos que provavelmente hesitariam em me dizer se estivéssemos fisicamente na mesma sala. A ausência do corpo físico muitas vezes não distancia, mas aproxima: é como se despir das defesas e ir para um mundo aparentemente abstrato, menos perigoso do que o encarado olhos nos olhos, e onde as palavras seriam menos embaraçantes.

Tem uma espécie de magia neste encontro de almas livres que só depois encarnam. Quando encontramos fisicamente a pessoa já temos uma imagem interior, o nosso modo de percebê-la é diferente porque no momento que vemos o “exterior” já sabemos alguma coisa de “dentro”.

Não quero dizer que encontrar-se primeiro na rede seja sempre melhor do que se encontrar primeiro ao vivo. Algumas vezes a experiência é mais verdadeira e mais rica; algumas vezes não. Mas não é um modo tolo de se encontrar como pensa quem nunca usou a rede.

Sem dúvidas é uma experiência nova e interessante. É extraordinário quando uma pessoa pode revelar-se com seu modo de se exprimir, de reagir, de dialogar ou de calar. É fascinante descobrir caráter, estilo, personalidade de alguém que jamais encontramos; pode acontecer que quando nos encontrarmos a nossa imagem corresponda a realidade. Normalmente, não se erra. O aspecto físico muitas vezes pode não surpreender, mas quase sempre o caráter e a personalidade são mesmo como tínhamos pensado.

Me parece que este percurso seja um saudável remédio a uma certa tendência de dar muita importância as aparências. Um pouco pelo culto aumentado e difuso do aspecto físico, um pouco por efeito da televisão, vivemos em uma cultura da imagem; muitas vezes pensamos que uma pessoa é aquilo que parece, que veste e como se enfeita, que esta é a sua identidade.

Talvez um dia a rede perderá a sua magia. Talvez quando teremos um espaço infinitamente maior do que aquele que encontramos hoje no vídeo; a aparência retomará o domínio, de uma forma ainda mais perversa, porque uma imagem transmitida é necessariamente alguma coisa mais fabricada que uma presença física palpável.

Mas por hora continuaremos a nos encontrar por meio de palavras, podemos dispor deste meio extraordinário e assim conhecer primeiro a alma, depois o corpo. Também podemos escolher, segundo o caso, o que preferimos dizer pessoalmente ou pelo telefone e que coisa, ao invés, preferimos escrever.

Esta não é uma coisa totalmente nova. A história é cheia de amigos e de amantes que por não se verem frequentemente enviavam cartas e mensagens. Quantas vezes dois apaixonados, mesmo se vendo todos os dias, sentem necessidade de trocar bilhetinhos? Mas o hábito de escrever estava desaparecendo em um mundo cheio de telefones. Com a rede nós o redescobrimos. Muitas vezes escrevemos coisas simples, mesmo tolas; brincamos ou falamos nada. Tem algum mal? É um modo de unir as nossas almas, dividir pensamentos que tem em si um valor independentemente de seu conteúdo.

Provavelmente é este o motivo principal pelo qual eu gosto de estar na rede: é um modo a mais de ser humano.


 

   
 

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